sábado, 21 de julho de 2012

Uma carta para minha mãe

[Publicado em 14/05/2006
no jornal O Estado do Amazonas]
Barriga da mamãe, 14/05/2006
Oi, Mãe.
Meu nome é Ana Clara. A gente não se conhece pessoalmente, mas já se ama muito. Resolvi lhe escrever pra dizer algumas coisas para você nesse nosso primeiro dia das mães. Mãe, eu nunca tive uma mãe. É a primeira vez. Pelo menos nisso a gente é igual porque você nunca teve uma filha. Somos nossas primeiras experiências.
Sabe, mãe, tenho medo de sair desse lugar quentinho e aconchegante onde estou. Passei já oito meses e meio aqui, encolhidinha. Mais esse espacinho aqui tem tanto amor e me protege tanto que tenho até medo de sair. Ouvi dizer que hoje aí o negócio tá feio. Em São Paulo, tem muito bandido brigando com polícia. Na Bolívia, um tal de Evo Morales tá querendo ficar com a Petrobrás. Eu não tenho a menor idéia do que é isso tudo, mas com certeza não é melhor do que meu cantinho aqui. O que me acalma é que sei que é você que vai tomar conta de mim.
Mãe, é verdade que pra eu me sentir acomodada e quentinha como estou agora você já arrumou meu quarto? Mandou fazer uns quadrinhos, comprou porta-retrato, pintou a parede de lilás, trocou a lâmpada praquela que regula, pesquisou pacas pra comprar meu bercinho, mandou fazer todos os lençóis de libélula? Como é que você sabe, mãe, que eu amo libélulas? É porque elas são pequeninas e frágeis como eu, né? Eu sei que de vez em quando eu ouço papai reclamar de uma tal de trena. Ele diz que toda vez que você pega na trena ele tem que assinar um cheque. O que é uma trena, mãe? E um cheque? Ah, deixa pra lá… Você me explica isso depois, quando eu nascer. Tem tempo. Papai eu sei o que é. É ele que fica segurando sua barriga e se assusta quando eu me mexo. Ele não sabe, mas eu faço de propósito só pra ver o nervoso dele. Fico gargalhando sozinha. Imagina se eu tivesse na barriga dele? Ele vive dizendo que gosta mais de mim do que você gosta. Eu sei que ele gosta muito, mãe, mas ele vai me perdoar: mãe é mãe.
Mãezinha, quando eu estava na sala dos anjos, uma pessoa bonita, com manto azul, veio me buscar. Ela disse pra mim pra eu me preparar que eu ia ser um bebê de uma mãe muito especial, que ia me amar muito muito, junto com meu pai. Ela disse também que eu fui muito desejada e que precisei de uma ajudinha pra poder chegar aqui. E eu estou aqui, mamãe. A senhora do manto azul me disse que mesmo depois que eu viesse para cá e nascesse, que ela iria ficar do meu lado pro resto da vida. Ela me conforta, mãe. É como se fosse você. Uma outra mãe, a dona Maria.
Mãe, deixa eu contar um segredo pra você: o papai é meio leso pra essas questões de data. Vai ser eu quem vai lembrar ele de todas as datas da família. Essa é uma das minhas missões quando eu nascer: ajudar o papai a lembrar das coisas, dos dias, dos aniversários. E levar coca-cola pra ele quando ele pedir. Mas isso só quando eu aprender a andar.
Mãe Bia, eu vou nascer no mês da Copa do Mundo. Eu não sei o que é uma Copa do Mundo, só sei que todos os bebês que vão nascer em junho só falam disso. Mas todos disseram também que não é pra gente se preocupar porque você nem vai ligar pra Copa do Mundo, só pra mim. Que eu sou mais importante de que o Ronaldinho ou Beckham. E o papai disse, eu ouvi, que vai tirar férias só pra ficar comigo. Isso é legal, mãezinha, porque o papai trabalha muito. Vou fazer muito cocô só pra ver a cara dele, que vai ter que limpar. Esse papai vai sofrer na minha mão.
Mãezinha, me disseram que não tem amor maior do que o amor de mãe. Foi a dona Maria que disse. Me mostrou a foto do filho dela, um homem bonito, barbado. Ele estava lá quando eu vim pra sua barriga. Me deu um beijo e um abraço. Foi tão bom, mãe. Ele adora criança.
Ei, mãe, quando é que a gente vai de novo naquele lugar onde eu posso fazer careta pra você e o papai olharem na televisão? Alguém fica cutucando minhas costas e me faz cócegas. Eu sei que vocês ficam me espiando, tá? O Pedro e me contou que fizeram o mesmo com ele. O Guilherme da Tia Camila também. Ele até se divertiu mostrando o coisa dele. Mãe, por que eu não tenho o coisa? Ah, depois me explica. Se prepara aí, tá, mãe? Quando eu começar com meus infinitos porquês eu não vou parar mais.
Mãezinha Bibi, eu já amo muito você. Porque você já cuida de mim. Porque você me desejou. Porque você me ama também. Eu sei que corro o risco de ser mimada por você. Acontece com toda mãe por causa da super-proteção. Mas o papai vai regular a gente que eu sei.
Nesse primeiro Dia das Mães juntinhas, quero dizer que sou muito feliz por ser sua filha. Não podia haver mãe melhor no mundo, eu sei. Mas eu ainda vou dançar pra você, fazer camisa de mãozinha com tinta, recitar poema, me vestir de bicho. Eu ainda vou ser sua confidente, vou pedir pra você pedir as coisas pro papai. Você ainda vai chorar quando me deixar na escola pela primeira vez, quando eu fizer o teste do pezinho, quando eu fugir pra namorar, quando eu chorar no seu colo por causa de namorado, quando eu me casar e quando eu puder ser abençoada como você e for mãe, dando um neto para você. Eu só peço uma coisa mãe: quero que meu filhinho tenha uma mãe igual a minha. Linda, carinhosa, feliz e que ama seu bebê, eu, a Ana Clara.
Deus te abençoe, mãezinha. E mês que vem estou aí, sentindo o aconchego dos teus braços e vivendo do lado de fora o amor que já sinto do lado de dentro. Eu amo você. Da tua, para sempre,
Ana Clara Eid Freire
PS: Manda um beijo pro papai também, senão ele fica com ciúme.

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