quinta-feira, 25 de abril de 2013
Os Berlindes Era uma vez numa pequena aldeia, onde as casas eram todas de tamanho pequeno e com muros construídos de pedra. Cercadas por jardins, campos e vales eram um encanto. Nessa aldeia só havia uma estrada central que a atravessava do incio ao fim. De cada lado da estrada estavam colocadas as casas como se tivessem sido postas ali, tal a maquete de um menino sob uma mesa. No meio das casas passavam ruas estreitas e limpinhas que nenhum papel vinha sujar. Com isto os jardins cheios de flores faziam da aldeia um miminho. Na grande praça da aldeia lá estava a igreja onde todos os aldeões se encontravam todos os domingos antes e apôs a missa dominical. Do lado esquerdo da igreja a câmara e a direita a escola. Por ser uma aldeia com poucos habitantes a escola tinha só uma sala de aulas e um professor, que dava aulas as crianças da aldeia. Para o professor era uma tarefa complicada porque tinha que dar aulas a crianças com varias idades. O professor era casado e tinha um filho que se chamava Francisco e que fazia parte do seus alunos. O Francisco era um menino meiguinho e sobretudo bem educado, inteligente ele fazia o orgulho de seus pais e por isso eles estavam sempre a recompensá-lo e isso era uma alegria para o Francisco que tinha uma grande paixão: os berlindes. Com dez anos de idade e quatro anos de trabalhos perfeitos na escola ele tinha ajuntado uns poucos deles. De todas as cores e de todos os tamanhos, grandes, médios e pequenos. De vidro maciço, de pedra e metal, manchados e intensamente coloridos, o Francisco tinha orgulho do seus berlindes e ainda mais do número fenomenal que ele tinha em sua posse. Guardados numa caixa que ele gostava de esvaziar em cima da sua cama para os contar e achar com orgulho sempre o mesmo número de cinquenta berlindes e até de lá ajuntar algum ganho no recreio da escola. Obviamente, naquela aldeia o Francisco não era a única criança que ali vivia, pois outras crianças lá viviam e partilhavam a mesma sala de aulas. No meio das outras crianças distinguia-se o Miguel, cujo menino vivia numa casa que estava situada à entrada da aldeia na estrada que vinha da grande vila e que à saída da aldeia ia se perder na serra. O Miguel tinha 9 anos, e uma irmã de 4 anos que ocupava o dia todo da sua mãe, o pai metia-se á estrada todos os dias para ir trabalhar. Assim, o Miguel não era o que se pode chamar um solitário mas, muitas vezes andava sozinho, até mesmo no recreio da escola não se misturava muito com os outros. Esse dia, o Francisco que se tinha levantado logo de madrugada, tomou o seu almoço e preparou-se para ir para a escola, sem esquecer de tirar da sua caixa uma dezena de berlindes para brincar com eles no recreio. Casaco fechado e boné pousado na cabeça lá vai ele assobiando uma canção alegre. - Até logo mamãe, já vou... - Anda vai Xico que o teu pai já lá deve estar à espera...Levas berlindes? - Sim, levo, uma dezena... tchau, beijinhos! - Tchau, filhinho... A correr e dois saltos naquela alegria da inocência que só uma criança tem, o Francisco atravessou a estrada e empurrou o grande portão que dava no recreio da escola. Alguns alunos já lá andavam a brincar e levantaram a cabeça ao vê-lo chegar. - Olá, Xico, disse logo uma amiga dele que se chamava Paula. - Olá Paula, então conseguiste a fazer os teus deveres? - Sim, consegui, obrigado Xico, sem o teus concelhos não conseguia. - De nada Paula, se precisares mais eu te ajudarei..Bem ainda faltam alguns minutos antes que meu pai chame para as aulas. - Quem quer jogar aos berlindes comigo? - Eu! responde logo a Paula e outros miúdos que os rodeavam. - E tu Miguel, não queres? - Não, não quero! Disse o Miguel afastando-se do grupo que também completavam o Zé e o Pedro . Ao vê-lo agir assim, o Francisco encolheu os ombros e olhou para a Paula com um ar de incompreensão. - Deixa lá Xico, ele é um selvagem, não gosta de nós, disse ela - Não digas isso Paula, o Miguel é só um pouco tímido. - Não é tímido não, é mas é um invejoso, só cobiça o que os outros têm. Eu não gosto nada dele. - Anda lá Paula esquece isso e vamos brincar. Foi assim que o Francisco seguido pela a Paula o Zé e o Pedro se dedicaram a jogar ao berlinde antes que o sino que anunciava o inicio das aulas se pôs a tocar. Mais uma vez o Francisco tinha tido sorte e a dezena de berlindes que ele tinha levado com ele tinha-se ajuntado mais oito e assim ele tinha no bolso vinte berlindes. Vocabulário, gramatica, matemáticas e geometria e assim se passou a manhã para chegar ao meio-dia. Assim que o sino tocou de novo logo se ouviu a algaria que faziam os alunos ao fim das aulas e que todos corriam para suas casas onde um jantar os esperava. No caminho para casa, Francisco acompanhado do seu pai disse-lhe todo contente. - Pai, ganhei oito berlindes. Se visses são extraordinários com cores magnificas. - Tá bem Xico, mas, sabes que não deves ganhar sempre, os outros meninos não têm tua sorte de ter tantos berlindes como tu. Sei paizinho mas ganho sempre mas também de vez em quando deixo ganhar um deles para que as vitorias sejam bem divididas. - És um rico filho, tenho orgulho de ti, disse-lhe o pai com um sorriso alegre. Assim se passaram alguns dias e até uma semana onde o Francisco um dia perdia, outro dia ganhava berlindes e o mais lindo é que mesmo o Miguel se tinha juntado a eles porque o Francisco tinha aceitado de lhe emprestar dois berlindes para começar. Ao fim de duas semanas aos vinte berlindes se tinham ajuntado mais quinze e o Francisco todo contente mostrava-os a todos, jogava-os e as vezes perdia-os, até que uma manhã no recreio das dez horas ele foi ao saco que ele tinha pendurado na chapeleira e dai ficou todo mudado, com um ar triste que toda a gente ia reparar. E claro o ar pensativo que ele trazia não escapou a ninguém nem mesmo aos seus pais. Num serão onde ele estava ainda mais calado os seus pais, preocuparam-se demais. - Francisco, disse-lhe seu pai. Tua mãe e eu pensamos que qualquer coisa se passou e que tu andas triste sem nos dizer por quê. - Não é nada pai... acho que ando um pouco cansado. - Hmm! Achas que sim? - Sim pai, acho. - Anda lá, diz a verdade, aconselhou a mãe dele. - Não posso, disse ele enfim, depois de ter tanto hesitado que seus pais estavam demasiados preocupados. - Então por quê? Peguntou o seu pai. A verdade pode sempre se dizer, as mentiras é que não. - Tá bem, têm razão... mas não é fácil de dizer. - Aconteceu alguma coisa de grave? Perguntou a mãe. - Acho que me faltam berlindes no meu saco! - Faltam-te berlindes, mas como assim? - Pois, eu tinha levado vinte berlindes e ganhei oito, lembras-te paizinho eu tinha-te contado? - Sim, lembro, respondeu o pai de Francisco. - Então, em seguida no outro dia ganhei quinze, e então eu tinha quarenta e três berlindes no meu saquinho e agora só lá tenho quarenta. - Então, não te faltam assim tantos, deixa lá, logo ganhas outros tantos. Interrompeu a mãe de Francisco. Nessa palavras da mãe do Francisco, o garoto acenou que sim enquanto o pai olhava par eles os dois abanando a cabeça. - Não Ilda, o Francisco tem razão, que sejam três ou só um berlinde a desaparecer. Isso chama-se roubo e não posso tolerar isso dos meus alunos. - Concordo, João, eu só queria fazer entender ao Francisco que há coisas mais importantes que os berlindes, estava -me a esquecer que foi com um gesto mau que desapareceram os seus berlindes. Nisto o seu marido João olhou para ela e sorriu-lhe com um ar entendido. - Sei, não te aflijas, confio demasiado em ti para saber que não ias deixar passar um ato tão vil. E, então Francisco, tens uma ideia de quem pode ser? Perguntou o João virando-se para o seu filho. - Não, respondeu o miúdo rapidamente. Acho que não sei... enfim...acho que.. - Achas o quê, filho? - Não sei mesmo, paizinho. - Tens medo de dizeres um nome? -Pergunta o João em ver o seu filho baixar a cabeça para o seu prato. - Está bem, entendo. Acabamos aqui a conversa, é tempo para irmos para a escola, e lá veremos o que se pode fazer. Foi então, que o Francisco e o seu pai, foram de mãos dadas para a escola. Os dois iam conversando e algumas gargalhadas acompanhavam as anedotas que o Francisco já sabia contar. Pouco depois, chegaram na frente da grande porta da escola onde já esperavam alguns alunos e também a Paula. - Olá Francisco, disse ela vindo ao seu encontro. - Olá Paula, tudo bem? - Eu, porreira, mas tu não parece. - Sim, está tudo bem, não te preocupes. - Bem, meninos, disse o pai do Francisco, como não tenho a vossa vida, vou indo, ainda têm alguns minutos para brincar, aproveitem para jogar aos berlindes. Trouxeste os teus, não é, Francisco? - Sim, Pai, trouxe. Acenou o Francisco com a cabeça. Anda Paula vens jogar? - Vou sim, e também o Pedro e o Zé, e talvez o Miguel, ele vêm ai, olha. Com a ponta do dedo, Paula indicava a rua onde vinha a chegar o Miguel, um sorriso brilhante sobre seus lábios. - Não, ele não, disse de repente o Francisco. E sem dar tempo à Paula de dizer outra coisa o Francisco virou-se para o recreio e avançou até ao canto onde tinham feito os buracos para o jogo dos berlindes. Surpresa, com o seu comportamento, a Paula chegou-se ao pé dele, ia para falar mas calou-se ao ver o rosto triste do seu amigo. Um quarto de hora e mais dez minutos passaram até o sino tocar, e assim começaram as aulas, onde todas as crianças tentaram se concentrar sobre os seus trabalhos, só a Paula e que de vez em quando levantava a cabeça e olhava uma vez para o Francisco e logo a seguir para o Miguel. Com certeza que algo se tinha passado entre eles os dois, pensava ela, mas ao olhar para eles, a Paula não tinha aquele olhar interrogativo de uma amiga que se preocupa por seus amigos, mas por ela. Duas horas se passaram e veio o momento do recreio. Lá fora, as crianças se encontraram para brincar e logo o Francisco pegou nos berlindes para ir jogar seguido do Pedro e do Zé. - Posso jogar com vocês? A voz conhecida o Francisco levantou-se de repente e enfrentou-o. - Não! Não podes, não te queremos conosco. Respondeu ele com força. - Como, assim? Pergunta o Miguel com olhar de espanto. O que é que eu fiz? - Tu, bem sabes o que fizeste, mas como já sei que vais negar, eu nem te pergunto, só quero que nos deixe e vás jogar para longe de nós. - Não sei o que tens , mas parece que me estas a acusar de alguma coisa e não sei o que é! - Pois sim que sabes e mete-me nojo de te ouvir negar, até me apetece te dar um murro. Foi assim que depois de mais alguma respostas os dois garotos se encontraram a rolar pelo chão aos socos e murros um ao outro. À voltas deles as outras crianças tinham feito uma roda e até alguns gritavam para que eles se separem e outros para continuarem. Até que, duas mãos fortes os levantaram quase do chão deixando-os espantados. - Então, o que é isso? É assim que se resolvem os problemas na minha escola. Dizia o professor com uma voz grave e severa. Sem folego os dois garotos olhavam para ele o Francisco baixando os olhos na frente do olhar sério de seu pai. - Francisco, quero uma explicação! Depressa! - Pois, sim pai, mas tu já a sabes! - Não, sei não! Qual é o assunto assim tão grave que se acaba numa bulha? - Miguel! Francisco! Nenhum responde. - Não sei senhor professor. O Francisco acusou-me, mas não sei de quê, e depois eu tentei defender-me e ele saltou-me decima. - Francisco o que é que eu fiz? Diz? Engulindo em seco, o Francisco levantou os olhos para o seu pai e depois olhou para o Miguel. - Roubaste-me berlindes! Disse por fim o Francisco com uma pequena voz. - O quê? Eu, roubei-te berlindes. Não, fiz isso, é mentira. - Sim foste tu. - Como é que podes afirmar isso, viste-me fazer isso? - Não, não te vi, mas sei... - Não sabes nada, não fui eu que te roubei os berlindes, foi... Aqui o Miguel, parou e olhou a volta dele, cruzando os olhos do professor que ficou calado mas deu-lhe a entender que ele também sabia e isso deu coragem ao Miguel. - Não fui eu... foi... a … Paula! - O quê? A Paula, perguntou o Francisco sem querer acreditar no que dizia o Miguel. - Como a podes acusar assim? É mentira. O Francisco já tinha os punhos cerrados pronto a saltar. - Vamos lá ver, acalmem-se os dois, disse o professor. Miguel acusaste uma pessoa talvez inocente, isso não se faz. - Eu sei que não se faz senhor professor mas é verdade. Foi ela. - Então se estas assim tão certo, não te importas que a chama para que ela também se possa defender? - Claro que não, senhor professor, chame-a. Foi assim que o professor deitou o olhar por cima dos alunos procurando a Paula sem a encontrar e muitos minutos depois, apôs de todos a terem procurado em toda a parte da escola, e que todos se perguntavam onde ela estava a Paula apareceu no meio da aula onde todos se tinham reunido. - Paula, estas aqui, olha que te procuramos por todos os lados. - Eu sei, eu ouvi. Disse ela de voz baixa. A Paula estava de pé ao meio da sala e suas mãos estavam escondidas de trás das costas. - Miguel disse que tu........ - Roubei os teus berlindes. - Mas, por quê, Paula? - Não sei, porque eram muito giros. - Mas eu dava-os se os querias era só pedires. - Não é bem isso... - Então o que é? - Não sei, disse a Paula desatando a chorar. Estava com ciúmes, pareceu-me que gostavas mais do Miguel desde que ele jogava mais vezes connosco. Desculpa, não fiz a mal. - Mas roubar, não se faz, Paula. Sabes? - Eu sei...Toma. Num gesto de vergonha a Paula avançou uma mão para a frente e abriu-a sobre os três berlindes. Sem saber o que responder mais, a Paula chorava com grande soluços, quando o professor depois de ter ouvido a conversa, se levantou e falou. - Bem, como vejo esta história é terminada. E o dia de aulas também. Amanhã quero-vos aqui ver todos de boa forma para responder as perguntas do exame que preparei para vós todos. Algumas protestas foram ouvidas , mas quase tímidas para que nem sequer o professor lhe prestasse atenção. No recreio da escola ouviam-se o choque dos berlindes no chão e a alegria daquele que vinha de ganhar. A paz estava de novo naquela escola daquela pequena aldeia, onde três amigos jogavam os berlindes e os partilhavam com a maior amizade. Será que foi verdade mas vi o sol dar uma pisca de olho ao professor....ai... ai.. ai... FIM
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